Agradecimentos
Antes de mais nada, gostaria de começar este artigo agradecendo meu professor de "Design de Jogo Analógico", Gabriel Batista (Gabiru).
Muito deste artigo foi baseado no material disponibilizado por ele em sala de aula.
Introdução
Aprender a teoria por trás das mecânicas dos jogos é essencial para quem está adentrando o mundo do Design de Games.
Em seu livro "A Arte de Game Design", Jesse Schell nos ajuda a compreender um pouco mais sobre os elementos fundamentais por trás das mecânicas dos jogos.
Este é o primeiro artigo de uma série de artigos que escreverei sobre Mecânica de Jogos seguindo as ideias do Jesse Schell, no livro citado acima.
Neste, falarei sobre o primeiro elemento fundamental da mecânica de jogos: Espaço Funcional.
Os próximos artigos seguirão a ordem descrita na lista do item abaixo.
Elementos da Mecânica
Num quebra-cabeças, mesmo que duas peças se encaixem, não necessariamente quer dizer que ambas deveriam estar conectadas. O que determina se a conexão entre as peças nos levará ao objetivo é a coerência na relação entre elas, o segmento de imagem que elas formam.
Embora quebra-cabeças não sejam jogos, há muitas semelhanças entre ambos. Ao pensar na mecânica de um jogo, devemos perceber seus elementos como partes de um sistema, onde todos os elementos se relacionam direta ou indiretamente entre si.
Mais do que perceber apenas os elementos da mecânica, é importante mapearmos as relações entre eles, pois assim conseguiremos informações suficientes para garantir um equilíbrio e uma fluidez no jogo.
Segundo Jesse Schell, os elementos da mecânica de jogo são os seguintes:
Espaços
Tempos
Objetos (com seus atributos e estados)
Ações
Habilidades
Regras
Objetivo
Desafios
Procedimentos
Recursos
Resultados
Jogador
Espaço
"Cada jogo tem um lugar em algum tipo de espaço. Esse espaço é o 'círculo mágico' da jogabilidade. Ele define os vários lugares que podem existir em um jogo, e como esses lugares estão relacionados entre si.
Como uma mecânica de jogo, o espaço é uma construção matemática. Precisamos eliminar todos os efeitos visuais, toda a estética, e examinar a construção abstrata do espaço de um jogo."
(The Art of Game Design, Terceira Edição, em Inglês, Página 166)
Devemos nos desfazer de toda e qualquer representação não-sistemática dos elementos do jogo, a fim de evidenciar o espaço funcional do mesmo - se o espaço é dividido em espaços individuais ("casas" em um tabuleiro, por exemplo), ou se é um grande espaço contínuo (de livre transição, como um campo de futebol).
Assim, conseguimos medir o equilíbrio entre eles de forma mais precisa e livre de distrações.
Projetar um jogo é, antes de mais nada, projetar sistemas interativos, onde o jogador e os elementos da mecânica interagem entre si, a fim de alcançar objetivos.
"Não há regras incondicionais e rápidas para descrever esses espaços abstratos e despojados dos jogos. Em geral, porém, espaços de jogo:
São individuais ou contínuos
Tem algumas dimensões
Tem áreas limitadas que podem ou não estar conectadas
" (The Art of Game Design, Terceira Edição, em Inglês, Página 167)
Nos jogos, existem dois tipos de espaços possíveis: os Individuais e os Contínuos.
No livro, em inglês, o autor chama de "Discrete Spaces and Continuous Spaces". Entretanto, escolhi por traduzir a palavra "discrete" como "individual", pois assim acredito que fica mais fácil de compreender.
Espaços Individuais
Espaços individuais são espaços que apenas representam limites, e não um espaço contínuo. Um exemplo de espaço individual é o jogo-da-velha, enquanto, um campo de futebol, é um ótimo exemplo de espaço contínuo.
Espaços individuais são como "casas", num tabuleiro. Segmentam o espaço em posições predefinidas pelo designer, eliminando a livre transição pelo espaço.
Jogo-da-Velha
No jogo-da-velha, por exemplo, as linhas cruzadas determinam somente os limites que identificam as posições possíveis, pouco importando os espaços entre elas, assim como também pouco importa onde, dentro de cada limite, o jogador posiciona o "X" ou o "O".
Ao abstrairmos um pouco, percebemos que o que importa, do ponto de vista da mecânica, não são os limites em si, mas sim as posições possíveis ("casas") representadas através deles.
O jogo-da-velha, quando retirada a estética, fica desta forma:
Se apresenta como um conjunto de nove pontos zero-dimensionais, que indicam as nove posições passíveis de serem ocupadas.
Nove posições individuais que significam algo no jogo.
Reparem, também, nas linhas que conectam cada um dos pontos. Elas representam as relações entre as "casas" (pontos), visto que, no jogo, quando se completa uma sequência de "casas" em linha reta, o jogador vence.
Há, então, uma relação direta entre as "casas" vizinhas prevista nas regras do próprio jogo, sendo esta representada pelas linhas adjacentes.
Sem essa relação, teríamos nove pontos desconectados um dos outros.
Banco Imobiliário
Um jogo com uma estética arrojada pode nos fazer achar que os espaços funcionais do mesmo são mais complexos do que realmente são.
O Banco Imobiliário, por exemplo, tem um tabuleiro 2D cheio de retângulos coloridos (propriedades). Entretanto, ao reduzi-lo a seus espaços funcionais, vemos que ele é, na verdade, um tabuleiro 1D, uma linha composta de 40 pontos individuais, representados por retângulos coloridos, que se conectam em ciclo.
Espaços Contínuos
Nem todo espaço é individual. Mesa de bilhar, campo de futebol, um mapa de um FPS, dentre outros, são alguns exemplos de espaço contínuo.
Neles, os objetos do jogo - avatar do jogador incluso -, podem transitar livremente, sem ter que obedecer posições predefinidas. Isso permite um outro tipo de dinâmica nos jogos.
Espaço Funcional como Ferramenta
Não importa se o espaço em questão é 2D ou 3D. Um campo de futebol é essencialmente 2D, mas se estivermos considerando a altura do gol ou a altura do teto, por exemplo, nosso modelo espacial se torna 3D.
Não existe um modelo único para cada jogo. Se sua intenção não envolve altura, num jogo de futebol 2D, por exemplo, não a considere em seu modelo. Use modelos 2D e 3D, quando necessário. Use as dimensões de acordo com as suas intenções.
O modelo espacial deve ser uma ferramenta útil, não um empecilho. Não faça dele mais complexo do que o necessário. E isso vale tanto para os espaços individuais, quanto para os contínuos.
O propósito de reduzir o jogo a seu espaço funcional é retirar as distrações, pois assim poderá enxergar o jogo como um sistema, sem levar em consideração a história, a estética ou qualquer outro elemento do mesmo.
O importante é chegar aos modelos abstratos do jogo e suas relações entre si. Pois assim poderá entender melhor os elementos da mecânica espacial de seu jogo, para que possa garantir um equilíbrio e fluidez.
Espaços Agrupados
Jogos podem conter "espaços dentro de outros espaços".
Imagine que você está num RPG tridimensional, sendo este um espaço contínuo, e encontra a porta de uma taberna. Ao interagir com a porta, seu avatar será teleportado para outro espaço - desta vez, um espaço fechado.
Dentro da taberna, imagine que o espeço é individual. Você somente pode escolher um dentre cinco banquinhos ao lado do balcão.
Vemos, neste caso, que ambos os espaços (contínuo e individual), não estão conectados de forma direta. Quando dentro da taberna, não existe qualquer influência de fora.
Isso não é realista, do ponto de vista geográfico, mas reflete a forma como interpretamos os espaços internos e externos, em nossa mente.
Jogos Não-Espaciais
Existem jogos que realmente não precisam de um espaço para acontecer. Um bom exemplo disso é o jogo das "21 Perguntas", onde um dos jogadores pensa em um objeto, enquanto o outro tenta adivinhar qual objeto é em 21 perguntas, obtendo somente "sim" ou "não" como resposta a cada pergunta.
Realmente, esse jogo não acontece em um espaço. Mas, a fim de analisar a mecânica do mesmo, podemos projetá-lo em um esboço espacial.
Separamos os elementos da mecânica em partes: a mente do jogador que contém a resposta, o ambiente de conversação e a mente do jogador que quer a resposta.
Ambas as mentes estão conectadas através do ambiente de conversação, no qual as informações são trocadas.
Vimos que, mesmo quando um jogo não acontece num espaço, ele pode ser projetado em um. Isso mostra que é possível utilizar esta ferramenta em jogos adimensionais.
Ser capaz de analisar seu jogo através de um - ou mais de um - espaço funcional abstrato, é uma habilidade perceptiva essencial a todo designer de games.
As Lentes do Espaço Funcional
Schell, em seu livro, propõe algumas perguntas úteis para os designers se fazerem sempre que precisarem analisar o Espaço Funcional de seu jogo.
São elas:
Neste jogo, o espaço é contínuo ou individual?
Quantas dimensões este espaço tem?
Quais são os limites deste espaço?
Existem sub-espaços? Como estão conectados entre si? Qual a relação entre eles?
Existe mais do que uma só maneira de se abstrair o modelo de espaço funcional deste jogo?
Conclusão
"Ao pensarmos sobre os espaços funcionais dos jogos, é fácil sermos influenciados pela estética [pela forma como o espaço se apresenta]. Existem muitas formas de representar o espaço funcional de seu jogo, e são todas boas, desde que funcionem para você.
Quando você consegue pensar sobre o espaço de seu jogo em termos puramente abstratos, você consegue abandonar suposições sobre o mundo real, e isso te permite focar nos tipos de interação do gameplay que você gostaria de ver."
(The Art of Game Design, Terceira Edição, em Inglês, Página 171)
O Espaço Funcional faz parte da representação mais abstrata e objetiva da mecânica de seu jogo, visto que elimina toda e qualquer interpretação subjetiva da análise, permitindo um ponto de vista menos enviesado sobre a mecânica.
É uma ferramenta poderosa, que te permite experienciar seu jogo como um sistema, não como uma experiência de jogo. Isso abre portas para análises mais assertivas na hora de se tomar decisões.
Referências
Em Texto:
A Arte de Game Design - Livro de Jesse Schell (Capítulo 12)
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